"A praça da Figueira de manhã,
Quando o dia é de sol (como acontece
Sempre em Lisboa), nunca em mim esquece,
Embora seja uma memória vã.
Há tanta coisa mais interessante
Que aquele lugar lógico e plebeu,
Mas amo aquilo, mesmo aqui ... Sei eu
Por que o amo? Não importa. Adiante ...
Isto de sensações só vale a pena
Se a gente se não põe a olhar para elas.
Nenhuma delas em mim serena...
De resto, nada em mim é certo e está
De acordo comigo próprio. As horas belas
São as dos outros ou as que não há. "
Quando o dia é de sol (como acontece
Sempre em Lisboa), nunca em mim esquece,
Embora seja uma memória vã.
Há tanta coisa mais interessante
Que aquele lugar lógico e plebeu,
Mas amo aquilo, mesmo aqui ... Sei eu
Por que o amo? Não importa. Adiante ...
Isto de sensações só vale a pena
Se a gente se não põe a olhar para elas.
Nenhuma delas em mim serena...
De resto, nada em mim é certo e está
De acordo comigo próprio. As horas belas
São as dos outros ou as que não há. "
Álvaro de Campos
8 comentários:
A Praça da Figueira, no que tinha de praça/mercado, é já mesmo apenas memória. Vã, porém, foi a destruição do que hoje podia ser belo. Esse lugar, lógico, sim, porque de troca de mercadoria por moeda. Plebeu também, porque de víveres. Um lugar de pregão.
Ilógico mantê-lo, porque no centro da cidade? Dispondo ao caos do tráfego? Sim. Mas outras utilizações poderiam ter-lhe sido concedidas. Contudo, era um tempo outro, em que património não fazia parte do vocabulário.
Um tempo, em que Lisboa, também, já se não fazia a jeito parisiense [que Paris, essa, conservou Les Halles, ainda que em nova roupagem]
Isto de sensações só vale a pena
Se a gente se não põe a olhar para elas
:) pois é… se nos demoramos a olhá-las, logo passam a percepções, e estas são já por demais cognitivas para que alma esvoace.
“Sobre sete colinas, que são outros tantos pontos de observação de onde se podem desfrutar magníficos panoramas, estende-se a vasta, irregular e multicolorida aglomeração de casas que constitui Lisboa. Para o viajante que chega por mar, Lisboa, vista assim de longe, ergue-se como a formosa visão de um sonho elevando-se até ao azul intenso do céu, que o sol aviva.”
Pessoa era um apaixonado por Lisboa e gostei que o apresentasse aqui.Beijo.
Ah, Pessoa...
"Quando o dia é de sol (como acontece
Sempre em Lisboa)"
Como é curioso, era era exactamente a sensação que eu tinha quando andava em fase de ida e volta entre a França e Portugal. Em Lisboa havia sempre um magnífico céu azul e sol, mesmo n Inverno.
A Praça da Figueira, sem figueiras ou qualquer outro tipo de vegetação era já um árido círculo de autocarros onde eu apanhava o 14 para Caselas. Cheirava fortemente a gasolina, os autocarros transpiravam literalmente, enchiam e esvaziavam-se de gente. A Praça da Figueira é um local de passagem. Apenas.
Tanta verdade em tão poucas palavras… Assim é Pessoa!
Quanto à Praça que aqui (re)lembra, agora é só um espaço vazio. Dos muitos que moldam hoje a nossa cidade...
Abraço
Só uma pequena nota: Também Paris não conservou os seus Halles. A “nova roupagem”, como aqui disse “divagarde”, foi na realidade a sua total demolição: http://coisapouca-07.blogspot.com/search/label/Paris
Luciana,
óbvio que Les Hallesnão mantém a estrutura em ferro forjado original, óbvio que não se mantém enquanto mercado [impensável no centro de Paris]. E, sim, o espírito é outro. Mas houve o cuidado de não ser lugar de atropelo de trânsito, de consentir um deambular, ainda que lugar de constante polémica[novas alterações se prevêm faz tempo], tal qual o Centro Pompidou e a Pirâmide do Louvre.
Nova roupagem vale pelo que vale... nova roupagem.
Divagarde,
permita-me discordar. Nova roupagem seria se tivessem mantido – como se chegou a considerar – a lindíssima estrutura original, com novas funcionalidades (centro cultural, de exposições, etc.).
Concordo que o mercado no centro de Paris - como aliás em Lisboa - tornaria as coisas bastante complicadas. Mas a demolição, pura e dura, foi um duro e inútil golpe patrimonial. Lá como cá.
Ainda assim, por aquilo que me foi dado ler, três dos pavilhões foram desmantelados, em vez de demolidos, estando agora em Nogent-sur-Marne e – pasme-se! – no Japão.
Entretanto, estou aberta a mais informações...
Abraço
PS- E quem diria que seria Pessoa a trazer a(s) Praça(s) de novo à discussão? :-)
São exactamente essas sensações que importam. Às vezes precisamos tanto delas como desse sol, que passem os anos que passarem, ilumina sempre os dias em Lisboa!
Um abraço
É um prazer ler e ver trazer para a discussão, o soneto de «FERNANDO PESSOA» na personagem do seu heterónimo «ÁLVARO DE CAMPOS», referindo-se à nossa antiga «PRAÇA DA FIGUEIRA».
Eu fui cliente da «Praça da Figueira» nos anos de (1947-1949), passei depois para o mercado na "MOURARIA" (hoje já demolido) ficava mesmo atrás da «CAPELA DA SENHORA DA SAÚDE».
Cumpts
APS
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