quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Lisboa e os Poetas (15)


"A Praça"

"A praça da Figueira de manhã,
Quando o dia é de sol (como acontece
Sempre em Lisboa), nunca em mim esquece,
Embora seja uma memória vã.

Há tanta coisa mais interessante
Que aquele lugar lógico e plebeu,
Mas amo aquilo, mesmo aqui ... Sei eu
Por que o amo? Não importa. Adiante ...

Isto de sensações só vale a pena
Se a gente se não põe a olhar para elas.
Nenhuma delas em mim serena...

De resto, nada em mim é certo e está
De acordo comigo próprio. As horas belas
São as dos outros ou as que não há. "


Álvaro de Campos

8 comentários:

divagarde disse...

A Praça da Figueira, no que tinha de praça/mercado, é já mesmo apenas memória. Vã, porém, foi a destruição do que hoje podia ser belo. Esse lugar, lógico, sim, porque de troca de mercadoria por moeda. Plebeu também, porque de víveres. Um lugar de pregão.
Ilógico mantê-lo, porque no centro da cidade? Dispondo ao caos do tráfego? Sim. Mas outras utilizações poderiam ter-lhe sido concedidas. Contudo, era um tempo outro, em que património não fazia parte do vocabulário.
Um tempo, em que Lisboa, também, já se não fazia a jeito parisiense [que Paris, essa, conservou Les Halles, ainda que em nova roupagem]

Isto de sensações só vale a pena
Se a gente se não põe a olhar para elas


:) pois é… se nos demoramos a olhá-las, logo passam a percepções, e estas são já por demais cognitivas para que alma esvoace.

Julieta Ferreira disse...

“Sobre sete colinas, que são outros tantos pontos de observação de onde se podem desfrutar magníficos panoramas, estende-se a vasta, irregular e multicolorida aglomeração de casas que constitui Lisboa. Para o viajante que chega por mar, Lisboa, vista assim de longe, ergue-se como a formosa visão de um sonho elevando-se até ao azul intenso do céu, que o sol aviva.”

Pessoa era um apaixonado por Lisboa e gostei que o apresentasse aqui.Beijo.

Unknown disse...

Ah, Pessoa...

"Quando o dia é de sol (como acontece
Sempre em Lisboa)"

Como é curioso, era era exactamente a sensação que eu tinha quando andava em fase de ida e volta entre a França e Portugal. Em Lisboa havia sempre um magnífico céu azul e sol, mesmo n Inverno.

A Praça da Figueira, sem figueiras ou qualquer outro tipo de vegetação era já um árido círculo de autocarros onde eu apanhava o 14 para Caselas. Cheirava fortemente a gasolina, os autocarros transpiravam literalmente, enchiam e esvaziavam-se de gente. A Praça da Figueira é um local de passagem. Apenas.

Luciana disse...

Tanta verdade em tão poucas palavras… Assim é Pessoa!

Quanto à Praça que aqui (re)lembra, agora é só um espaço vazio. Dos muitos que moldam hoje a nossa cidade...

Abraço


Só uma pequena nota: Também Paris não conservou os seus Halles. A “nova roupagem”, como aqui disse “divagarde”, foi na realidade a sua total demolição: http://coisapouca-07.blogspot.com/search/label/Paris

divagarde disse...

Luciana,

óbvio que Les Hallesnão mantém a estrutura em ferro forjado original, óbvio que não se mantém enquanto mercado [impensável no centro de Paris]. E, sim, o espírito é outro. Mas houve o cuidado de não ser lugar de atropelo de trânsito, de consentir um deambular, ainda que lugar de constante polémica[novas alterações se prevêm faz tempo], tal qual o Centro Pompidou e a Pirâmide do Louvre.

Nova roupagem vale pelo que vale... nova roupagem.

Luciana disse...

Divagarde,

permita-me discordar. Nova roupagem seria se tivessem mantido – como se chegou a considerar – a lindíssima estrutura original, com novas funcionalidades (centro cultural, de exposições, etc.).

Concordo que o mercado no centro de Paris - como aliás em Lisboa - tornaria as coisas bastante complicadas. Mas a demolição, pura e dura, foi um duro e inútil golpe patrimonial. Lá como cá.

Ainda assim, por aquilo que me foi dado ler, três dos pavilhões foram desmantelados, em vez de demolidos, estando agora em Nogent-sur-Marne e – pasme-se! – no Japão.

Entretanto, estou aberta a mais informações...

Abraço


PS- E quem diria que seria Pessoa a trazer a(s) Praça(s) de novo à discussão? :-)

Mª João C.Martins disse...

São exactamente essas sensações que importam. Às vezes precisamos tanto delas como desse sol, que passem os anos que passarem, ilumina sempre os dias em Lisboa!

Um abraço

APS disse...

É um prazer ler e ver trazer para a discussão, o soneto de «FERNANDO PESSOA» na personagem do seu heterónimo «ÁLVARO DE CAMPOS», referindo-se à nossa antiga «PRAÇA DA FIGUEIRA».

Eu fui cliente da «Praça da Figueira» nos anos de (1947-1949), passei depois para o mercado na "MOURARIA" (hoje já demolido) ficava mesmo atrás da «CAPELA DA SENHORA DA SAÚDE».

Cumpts
APS